Impossível abrir mão de alguns vícios. De beber até que dá. Mas não de adorar analisar as personas, brincar de adentrar o íntimo de desconhecidos e "ver a vida com os olhos do coração". Noite recente, muitas garrafas esvaziando, e bem antes de começar a usufruir do líquido precioso, tornei-me vítima de uma senhora serelepe. Apesar de estarmos entre vários amigos (quase todos do sexo masculino), nem me incomodei com os olhares maliciosos típicos dos boys seqüelados de plantão tamanho foi o devorar daquela mulher pra cima de mim. Sem tirar os olhos do meu decote, da minha boca, ter me chamado de broto e de linda várias vezes, me senti quase "bulinada" inicialmente...mas percebi que o problema ali não era sexual, mas afetivo. Solidão. Depois de muito uísque, ela dera algumas pistas, e, claro, fiquei comovida. Precisava do mínimo de atenção, me tocava, me jurava amizade e me enchia de elogios, além de, claro, me oferecer os amiguinhos dela um a um. O olhar dela revelava o quanto era importante estar entre pessoas; o filho casara; era separada havia 10 anos. Como de costume, me transportei pra vida daquela mulher. Deu tanto medo que voltei rapidinho pro meu corpo: coração meio surradinho, mas quente de abraço. Talvez eu me transforme numa beberrona pegajosa no futuro; nunca se sabe. Porque, como ela, gosto de estar cercada por gente. Sempre. Mas não podem ser figurantes - amigos, amores, parentes, pessoas que se limitam ao superficial. Têm que somar, acrescentar, multiplicar, transcender e extrair de nós o melhor. E talvez seja essa uma das grandes maravilhas, por exemplo, da maternidade: a sensação de que nunca será só.
Dia seguinte, resolvi começar a rever os espisódios de Sex and the City, primeira temporada...Senti alívio por encontrar minhas velhas amigas Carrie, Miranda, Samantha e Charlotte (necessariamente nessa ordem), que são solteiras, mas não sozinhas. Elas concordaram comigo, lá no café de costume, que, se uma solteira incomoda muita gente, duas solteiras incomodam incomodam muito mais. Casais amigos nos tentam arrumar namorado; namoradas pitbulls dos amigos nos consideram ameaça; namorados machistas de amigas também; tias velhas nos acham coitadinhas e estranhos no restaurante acreditam sermos frustradas, mal-amadas, encalhadas ou lésbicas. Mas só devem temer a solidão aqueles que se esquivam do convívio com pessoas-plus, os egoístas, auto-suficientes, narcisistas ou seres do mal em geral. Com o avançar da idade, precisando de apoio, lembrarão dos que deixaram ir, os que afastaram voluntária ou inconscientemente. Quem cativa, preenche, chama e abraça nunca temerá o escuro da solidão, porque a eventual ausência de pessoas será luminoso recinto de lembranças boas, castelos construídos e heranças do amor que se plantou. Podem apagar as luzes. O medo é só pra quem não mantém acesa a chama interior.