10 de janeiro de 2011

Medo do mais do mesmo

Sabe a diferença entre Regina Duarte e eu? Não tenho medo. Sim, muito infame essa piadinha; perdoável, no entanto, por considerar o mesmo nível do ridículo a covardia, o medinho da vida, a frescurite que confere um ar Pati ou donzela de faroeste a muitas minas por aí. Não que seja destemida de tudo, heroína, peito de aço. A tirar pelo pavor a sapos, bandidos e patins. O caso é que o desconhecido, em vez de assustar, me encanta. O escuro pode revelar uma bela paisagem ao acender do interruptor. O túnel, aquela velha luz. E o que se desconhece, algo de bom. Sim, porque o previsível não permite esperança, expectativas múltiplas, escolhas sem fim. E é disso que me queixo, de quando a gente já sabe onde os caminhos vão dar. De quando a monotonia chega mesmo antes da parte boa. Do saber da frustração vindoura, da sensação de filme assistido, figurinha repetida. Isso é que dá medo: mais do mesmo. Como uma amiga querida, que acabou um relacionamento infrutífero há pouco e não sabe viver sem o cara que praticamente só a deixava mal, assim como outros que o mesmo fizeram. Ela, pelo jeito, não teme a repetição, a produção em série de desgraças, o disco riscado. Talvez se sinta mais segura com o que conhece. Aquela coisa de quando a vítima se apega ao algoz com medo que venham outros cujas malvadezas desconheça. E olhe que é uma coisa quase sem querer. Não creio, porém, em segurança, mas em algo que nos bote pra cima, faça bem, traga luz. E, nesse caso, o que não sabemos é ouro! Pode ser tragédia, porcaria, tempo perdido [acho que estou usando clichês de títulos de Legião demais aqui...], mas também pode ser a melhor coisa da vida, êxtase, alegria, construção. Válido, portanto, acreditar num porvir misterioso. Porque ser/ver A Namoradinha do Brasil assustada ninguém aguenta mais.  

4 de janeiro de 2011

Complexo de Sula Miranda

Daqueles assuntos de quando já tá faltando assunto na mesa feminina. Quase um jogo da verdade, com figurinhas divertidas sobre cafuçus. Contávamos peripécias da categoria Profissão. Saiu de tudo, de operador de fotocopiadora a mágico, passando por puliça e até bombeiro. Mas uma palavra pasmou o grupo: caminhoneiro. Ela já disse sorrindo, meio baixinho, como que a confessar somente pelo dever. Não passou batida, porém. Todas queriam saber da aventura Sula Miranda da garota, que, em vez de cobrir o rosto com as mãos, ensaiou um olhar saudoso de quem comeu e gostou (no bom sentido). Narrou o acontecido, o romantismo do rapaz, o nível alto de paixão daqueles beijos, a pegada do operário das estradas. Destacou também o respeito, a consideração, a paciência. "Coisa rara entre os cults, não?". Verdade. Logo todas se imaginaram no conforto da boleia, a ouvir Roberto Carlos, brincando com aqueles rosários e fitinhas pendurados no retrovisor. Contemplariam o grande adesivo do Cristo. Quiça o próprio crucifixo, dependendo da fé. Cada uma delas imaginou seu rosto tatuado no braço do robusto caminhoneiro, seu nome no parachoque, no meio de frases de amor. Suspiraram junto à nostálgica primeira-dama do Clube Irmão Caminhoneiro Shell. A boyzinha de Pedro e Bino. A inspiração de longas estradas. E quiseram ter estado lá.