25 de maio de 2009

Rosa-choque


Da série Frases de impacto femininas. "Não consigo sentir o risco", finalizou a conversa a bela mulher travestida de ninfeta, ao ser sabatinada por declarar o não ciúme, a não insegurança em relação ao marido. Ela não percebeu, mas meus olhos brilharam de um orgulho estranho. Daquele como se ela fosse parte minha, como se fosse eu mesma até. Alguns podem chamar corporativismo, sexismo, feminismo, gosto pelo coletivo de iguais. O fato é que me despertou um sentimento há muito adormecido pelas bandas abusadas de cá dentro da blusa. Mulheres são belas, fortes, maravilhosas. Podem ser tão adoráveis ao ponto de te desviar a atenção do homem amado (que não te ama, claro), mesmo que nem haja fanatismo ou vocação lésbica. Seguras, donas de si, de caráter, livres, charmosas, geniais, engraçadas, bailantes, risíveis, atrapalhadas, gargalhosas, talentosas. Mulher que não consegue sentir o risco da traição, pelo simples fato de valorizar o tempo ao lado do amado, sem briga, desconfiança, drama ou medo. Mulher que sabe ser genial até na cozinha, e levar tão a sério a arte gastronômica que ser chamada "cozinheira" lhe confere orgulho maior do mundo. Mulher que dorme tranquilamente no sofá e acorda linda depois da noitada, cuja volta pra casa fora marcada pela presença asquerosa de baratas na cama. Mulher que desce do salto poser da modernice e se declara para um loser-bomba, dos tantos que desfilam por aí, e ainda conta pra todos os amigos sem pudor. Das que amam demais. Das que não se abalam. Das que cuidam. Das que cantam. Das mães. Das filhas. Havia me esquecido de toda essa carga que desperta o bairrismo, a torcida, o orgulho, o murrinho no peito. As sonsas, fingidas, hipócritas, invejosas, traidoras e traiçoeiras...essas não são mulheres. E, tirando indianos, quem liga para as vacas?

17 de maio de 2009

Golpe Fantasma


"Levei um golpe fantasma da Rádio Recife", narrou, em manchete, a moça chorosa ao se lamentar do estado de desgraça que a acometia. O golpe fora uma música do Abba, que tocara no bacurau do Rio Doce/CDU, condução que acabara de pegar após momentos de romance descartável com o ser amado. Chorou sob o olhar do cobrador, que não a deve ter condenado, pois certamente já levou dessas facadas invisíveis do acaso, das quais as musicais são as mais doloridas. Ao menos, foi Abba e não José Augusto que a golpeou tão cruelmente naquela noite de lua cheia de lágrimas. E pensar que a canção Ele, do rei dos cotovelos machucados, já tinha feito estragos maiores em público. Não menos do que Fui Eu, Minha História e outras tantas de Zé Guto das Causas Impossíveis. No trajeto, lembrou que, dias antes, seus olhos se liquefizeram durante o karaokê, enquanto cantava Frisson, de Tunai. Sentiu vergonha de tanto apanhar. Se os amigos a vissem berrar de desespero cantando hits pop de Lulu Santos e Kid Abelha, no chuveiro, provavelmente a matriculariam num intensivo de defesa pessoal. Havia se transformado num saco de pancadas; socos, pontapés, voadoras, rasteiras, bofetes que vinham de todos os lados, do rádio, da TV, dos casais de namorados nos bares, das fotos, das viagens do almoço, da lua, dos goles solitários ou não. Pediu parada e decidiu reagir. Mo Cuishle! Inspirou-se no karatê de Daniel San e no kung fu da Mamba Negra "Noiva", e planejou pular corda, lavar vidros, pintar cerca, correr na praia e todo o treinamento manjado dos ídolos da telona. De vítima, passaria a algoz. Agora, a melhor defesa seria o ataque, guerra seria guerra e bandido bom seria bandido morto. Estava vestida de aço. E nem bala, nem choque, muito menos bomba abalariam o poder de alguém que adotara o sobrenome Balboa.

11 de maio de 2009

Vida vizinha


É difícil dormir à noite
Fechar olho e mente sem peso
Cessar pensamento e desejo
Livrar coração do açoite

Triste ter de apagar a cabeça
Quando a alma se põe levinha
E a história de uma vida vizinha
Passa em filme e vela acesa

E os sorrisos adoçam a tela
Campos de flor, cabelos ao vento
Vida de cor e luz é aquela

Lá floresce o que a vida perdeu
E não se permite ouvir lamento
Posso ser tudo do amor que é meu