29 de março de 2012

Facetrix

Antes de tudo, um excelente espaço para os estudiosos da psiqué e das artimanhas emocionais. Tal pode ser a grande sacada do Facebook, se nos desdobrarmos do corpo congelado naquela cena rotineira protagonizada pela tela cheia de rostos. Ao sairmos de nós mesmos, ali num estado de "pause", talvez alcancemos visão panorâmica, privilegiada do que se passa nas entrelinhas ou nos entreposts. E é possível, nesse estado, vermo-nos maltrapilhos e esfomeados, em estado de transe, concetados todos, plugados pela nuca, num dispositivo que dá acesso à Matrix. Ou a qualquer dimensão de um mundo tão real quanto o de Papai Noel ou do Coelho da Páscoa. Lá somos lindos, livres e autênticos. Somos ricos, cheirosos e críticos. E como somos críticos! Afinal, se as fotos de nosso perfil e as descrições sobre nosso gosto musical constroem nosso avatar de perfeição, por que não utilizarmos também os programas de moralismo e de semideuses dos quais fizemos download para lançar mão na Facetrix? Programamos mecanismos de alto poder e ofertamos verborragia aos quatro cantos do mundinho que aceitamos como nosso. Para tanto, temos o apoio do nosso amigo Google, o Oráculo, que nos fornece frases de pessoas célebres, cuja genialidade acabamos por anexar também ao nosso banco de dados. Somos e podemos tudo. Tratamos dos temas os mais polêmicos com a propriedade de quem está acima do Bem e do Mal. Tachamos as pessoas com os adjetivos mais ferinos. Em alguns momentos, despertamos com a nuca desplugada. E vemos nossa figura cadavérica perecer. Lembramos dos nossos defeitos e crimes e de como temos exatamente as características daqueles que condenamos com belas palavras. Mas é só por um tempo. Logo voltamos ao nosso mundo de pequenos quadrados, rostos que falam com graça e que se abraçam com a cortesia dos que reinam. Que dormem o sono dos justos. E que se alimentam de frases de efeito para entorpecer a necessidade de se evidenciar e chamar a atenção do outro e escondem a autoestima mais baixa que o chão.

4 comentários:

Marco Santos disse...

Quem dera isto fosse apenas o que ocorre no facebook. No geral vivemos muitas vezes de aparência, status, tendo agradar "A" e "B", mostrando ao mundo como somos descolados, amigos, que temos um pensamento progressista, que somos os exemplos a serem seguidos... etc.

Quem dera isto fosse uma característica do facebook ou de redes sociais e que no final fosse tudo dissociado da vida que levamos.

No final das contas, a vida virtual pode até potencializar a hipocrisia, mas com certeza ela está presente na sociedade muito antes de se falar em virtualidade.

Anônimo disse...

Acho q o mundo virtual também nos anestesia para as ações reais. Postamos algo como "Sou contra a exploração dos menores" e nos sentimos tão engajados quando na verdade continuamos sem fazer nada para mudar a realidade.

Eduardo disse...

Ah Jornalista!!! Que bom ver post novo aqui!

Todos são leoninos no face né? Sempre sorrindo nas fotografias e nos autos-desenhos rsss.
Mas fora as mascaras virtuais, que nada mais são do que as nossas máscaras cotidianas, não há nada que substitua aquele momento da nossa amiga Leila. Que se chega em casa, se vê o resto de tudo e, quando vem o silêncio, tomar um vinho e ouvir Coltrane.

Não faço mais isso, mas entendo muito bem.

Renatinha disse...

Verdade, gente. Caco, que lindo! Às vezes as coisas são difíceis, meu amigo. =)