21 de setembro de 2010

O Bem contra o Mal

Acho que agora entendo porque deixei de me emocionar com filmes, gibis e músicas sobre super-heróis. Sim, talvez porque eles não existam também. Mas porque acreditar nessa coisa do bem que sempre vence o mal era questão de fé. A do He-Man era hino: "Eu tenho a força/Sou invencível/Vamos, amigos/Unidos venceremos a semente do Mal". A do Thundercats arrepiava: "Mas só quem luta pelo Bem é invencível/A chama da justiça nunca vai se apagaaar". À medida que o mundo tornava-se mais cão, ficava difícil esperar pelo Gato Guerreiro ou o sinal da espada de Lion. E olhe que perder a fé na justiça é enterrar outras grandiosidades cósmicas como a felicidade, a paz e até Deus. Pagar o mal com o bem, amar os inimigos, entender que o Universo conspira a favor de quem é bom - nada fácil em tempos de canalhice, impunidade e mau-caratismo. Até que você olha direitinho ao redor. E pensa grande (como Pink Dink Doo). Esgotadas as esperanças e as lágrimas, eis que emerge de dentro do mar sangrento do seu coração a velha fé. Fé na vida, fé no homem, fé no que virá? No que virá, por favor. Sem limão e com gelo. Não é que, de fato, as coisas costumam ficar legais no final quando a criatura possui algum mérito? E que os malvados favoritos dos infernos só se fodem Brasil em alguma (tarda, mas não falha) hora? No fundo, não vale a pena tentar entender a tal justiça nestas bandas de cá deste planetinha-guri como fosse uma historinha da Liga. No entanto, perder a esperança no que há de bom seria o fim. E, para encarar as coisas com a simplicidade que elas demandam, há que se fazer pequena escolha: ou você é do Bem ou é do Mal. Diga logo. E haja como tal. Não se reprima, não seja geminiano ou libriano ou bipolar demais. É o fim do relativismo, do situacionismo ladrão e da liberdade de emoções. Agora é pa-pum, pei-buf, diabinho ou anjinho nos ouvidos. Se ser bonzinho só faz da gente vítima da Horda, chama a galera do Bem, os poderes de Grayskull ou o Robin. Ao menos um Chapolim Colorado vai aparecer (não é possível!). Ser enganado, traído, caluniado ou o que for pode não ser o fim da guerra se der pra baixar o Gandhi ou ouvir um dos mantras de Legião - "É o Bem contra o Mal/ E você de que lado está?/ Estou do lado do Bem/ Com a luz e com os anjooos". Afinal, como convenceremos nossos filhos a não migrar para o lado negro da força? Quanto ao Mal, chuta, que é macumba! Pow! Bum! Soc! Puft!

15 de setembro de 2010

Casados carentes


Não poderia escrever melhor sobre as pessoas infiéis, infelizes ou apenas confusas nos relacionamentos. Vale muito!  http://migre.me/1j9kd

10 de setembro de 2010

Uma questão de dureza

Daquelas comédias da vida privada. Da vida como ela é. Dos retratos do cotidiano ou qualquer outro tipo de plágio da vida real e do romance já manjado na literatura. Regina e Walmir eram um casal morno. Aliás, não podiam se considerar um casal, uma vez que eram práticos demais para tanto. Ele por alimentar nela apenas mais uma de suas criações fantasiosas do ideal de mulher - que, claro, sempre pendiam para uma projeção das prostitutas francesas classudas misturadas com as mulheres intelectuais dos botequins comunistas. Ela por se aproveitar da companhia pacata e quase sempre previsível. Homens previsíveis têm seu encanto: você sabe bem o que esperar e até onde ir. O fato é que insistiam, por algum motivo, naquela mesma fantasia falida: ele não resistia aos seus encantos; ela cedia para renovar a cútis. Até aquele domingo, pé de cachimbo. O touro é valente, bate na gente. O buraco foi fundo. Lençois intactos a partir de então. Rejeitado, Walmir logo pôs a culpa na fila de pretendentes, de A a Z, que Regina deveria ter aos seus pés. Afinal, para que ela não quisesse mais sustentar aquele romance de quinta, só poderia ter outros na jogada. De fato, a moça tinha lá seu fã-clube, embora preferisse escolher cautelosamente seus pares. Até escolhia demais, ao ponto de ser taxada de pudica, frígida e até sapatão. Por isso escolhera o velho amigo Walmir, o digno, o bom, o grande. Sim, era bem esse o problema na verdade. Não o fato de ser bom, ou grande, se é que vocês me entendem. Mas Regina era lúcida demais para se valer de anatomia. Era preciso dureza de caráter. Firmeza de postura. Rigidez de atitude. Walmir falhara não só na virilidade, mas no que importava mais, no respeito à parceria cênica da velha estrada. E fecharam-se as cortinas. E o palco se quedou mais morno.  

5 de setembro de 2010

Com açúcar, com afeto

Naquela noite olhou-se com espanto ao voltar para casa. Sentia-se diferente não por grandes novidades, mas por reconhecer sentimentos de que havia se esquecido. Até sorriu de um jeito envergonhado - como se ainda pudesse tocar o rubor da meninice com dedos sem anéis. Ele era um menino. Nunca gostara de rapazes mais novos - ou tão mais novos - pela associação com a imaturidade. Talvez até tivesse talento para cuidar no passado, quando o instinto maternal era latente e carente. Não pretendia se envolver com alguém numa fase tão calma quanto conturbada. Tempo, disposição e até vontade eram artigos em falta no seu estoque cotidiano. Todavia aquele rapaz que começava a viver a fase adulta, para o qual jamais olharia nas caminhadas pelas calçadas - embora fosse um carinha atraente -, provocou-lhe um sorriso fácil e um pouco de reflexão. Ele a desejava e a fez perceber muito claramente seu afeto naquela noite inocente. Não foi um encontro, mas o reencontro daquela mulher com o que lhe restava de doçura. Um homem que não lhe pedia nada, que não tentava satisfazer desejos simples ou exibir-lhe como troféu ou fazê-la doentiamente de bengala para seus males. Ou mesmo um homem sem aliança, que não a queria como complemento dos atributos que sua noiva ou esposa não possuíam. Sem preconceitos que podiam impedi-lo de se envolver com uma mulher mais velha e com família. Enfim, descobriu-se frente a sutilezas que acreditava perdidas no passado de ilusões, quando ainda acreditava em machos-alfa, Papai Noel e Coelhinho da Páscoa. Ele queria estar ao seu lado, e não tinha o menor pudor em demonstrar isso. E o brilho naqueles jovens olhos talvez tenham contagiado os seus, que, há muito, nem marejavam. Talvez nem devesse dar alguma esperança ao rapaz. Mas ele tinha de saber que seu afeto a fizera menos amarga, com uma boa dose de açúcar. Foi dormir com o coração 10 anos mais leve.